28 julho 2010

Vidas iluminadas


Li na Revista Quem uma declaração de Ciça Guimarães que lavou minha alma. Tive o prazer de entrevistar muitas vezes a atriz em minha profissão de jornalista. Sempre gosto de ligar para ela quando faço alguma enquete porque Ciça é acessível e tem um otimismo que faz bem a quem fala com ela. E não é que no momento mais difícil e doloroso da sua vida a Ciça dá um grande consolo a quem, como ela, perdeu um filho, ou um ente querido?

“Eu tenho mais pesar desse pai, dessa mãe, desse menino, por terem tido esse tipo de atitude. A vida deles está mais destruída do que a minha. Eu tenho luz, sou iluminada. Eles estão nas trevas, na escuridão total”, disse ela na entrevista referindo-se a família do atropelador de seu filho Rafael, morto aos 18 anos no último dia 20 de julho, que afirmaram ter pago propina aos policiais para escapar da responsabilidade do acidente.

Tive um primo atropelado na Linha Amarela do Rio de Janeiro. Ele era jovem, estava noivo, cheio de planos e fazia um serviço temporário como Papa Fila, aqueles atendentes que recebem o pedágio ao longo da via para esvaziar a fila. Leonardo, Léo, como o chamávamos, era um doce de ser humano e muito solidário. Lembro que ele gravava em seu vídeo as aparições das Mães do Brasil nos programas que elas apareciam como fez dias antes de sua morte. No dia em que saiu para o trabalho Léo se despediu de minha tia dizendo:

“Sabia que você é a melhor mãe do mundo e eu te amo?”

Como Rafael, Léo era o filho caçula de três irmãos, o único que ainda morava com minha tia. Quem iria imaginar que naquela noite um rapaz invadiria a área dos pedágios em alta velocidade e atropelaria meu primo, que morreu na hora. Léo nem era para estar ali. Resolveu cobrir o turno de uma colega grávida que naquela noite não se sentia bem. O rapaz que o atropelou, no julgamento, que ainda não teve sentença, alegou privação de sentidos. Há quem diga que ele estava bêbado, mas não foi feito o teste do bafômetro. Além de tirar a vida de Léo, o atropelador devastou a vida de minha tia. Ela nunca conseguiu superar a perda e a ausência.

Uma vez, minha prima, irmã do Léo, o viu no Centro do Rio, caminhando e falando sozinho. Minha prima disse que foi tomada de um ódio. Eu também. A liberdade de um assassino afronta a família da vítima. Minha prima, porém, comentou: “Ele devastou nossa família, mas não tem a nossa paz.”

Hoje lendo as palavras de Ciça lembrei de minha tia e das Mães do Brasil. Elas não tem ódio, rancor, só dor. E uma profunda pena desses seres sem luz que devastaram suas vidas roubando-lhes a vida dos filhos. Elas seguem devastadas, mas iluminadas. Essa luz é que lhes dá a capacidade de superação. Ciça vai seguir iluminada também.

Nas fotos meu primo Léo em três fases de sua curta, mas iluminada vida.

Por Wal Ferrão

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