25 julho 2014

Almas paradas

 
 
Ontem estive na casa da Mãe do Brasil Jovita Vieira, mãe da Priscila Belfort, desaparecida há 10 anos. Me emocionei muito ao ouvir o depoimento da Jovita para a repórter Renata Couto, da TV Anhanguera, filiada da TV Globo em Goiás.  Flagrei com minha câmera esse olhar da Jovita e de outra Mãe do Brasil, a Graça Oliveira, mãe do Luan enquanto assistia a entrevista da amiga. Independente de raça, credo, condição social, as histórias são as mesmas, só mudam os personagens. Presencio ao longo de 15 anos as mesmas lutas, comuns no universo de todas as mães de desaparecidos: descrença, descaso, falta de investigação, morosidade da Justiça. E a busca constante e sem fim pelos filhos.
 
A pior das lutas é a falta de respostas. E o passar do tempo. Perceber que o tempo vai passando para todos: para os outros filhos, para os maridos, para a família, para os amigos é desesperador. O avançar do tempo exige das mães um avanço que elas não estão preparadas para realizar. Como prosseguir se a vida parou no exato instante em que o filho desapareceu.
 
Sim, elas avançam. Não se sabe como. Cumprem o papel de mãe, profissional, mulher. O corpo prossegue, mas a alma para junto com o desaparecimento do filho. Acho que a forte ligação das mães comigo vem justamente do fato de que acolho a revolta delas em manter a alma parada até que a resposta chegue. O que aconteceu? Pode não parecer mas existe uma atitude muito revolucionária nessa imobilidade da alma. Como disse Joana Sena, outra mãe que participou da entrevista ontem. "Não é possível para uma mãe continuar como se seu filho nunca tivesse existido ou se desintegrado no tempo."

Ontem a equipe de reportagem se mostrou encantada. Que sentimento é esse que une vocês? Amizade? União? determinação? É tudo isso, mas principalmente, a aceitação da imobilidade da alma onde o amor mora. Uma vez li que no vazio mora o verdadeiro sentido da existência. O que eu sei é que tem uma vida de muito significado no exato instante onde ela parou. Desse significado é que surgiram as mudanças conquistadas por mim e pelas Mães do Brasil.


Por Wal Ferrão
wal.ferrao@portalkids.org.br
 

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