12 março 2007
Transtorno psíquico tornou Cristiano um menino de rua
Maria do Socorro Reis, 43 anos, já perdeu as contas de quantas vezes seu único filho, Cristiano Reis Sampaio, 11, foge de casa. Há cinco anos a rotina da faxineira é sempre a mesma: Cristiano pede para ir brincar com as crianças da comunidade onde moram em Jacarepaguá, zona oeste do Rio de Janeiro, e, ao procurá-lo, descobre que ele fugiu. O motivo dessa fuga? É um mistério que a mãe quer descobrir.
“Antes de chegar as Mães do Brasil eu pedi ajuda em tudo que foi órgão, mas ninguém conseguiu resolver o problema do Cristiano. Muitos desconfiaram que meu filho sofria maus-tratos, cheguei a ser acusada muitas vezes, mas ninguém veio em minha casa verificar as condições que Cristiano vivia. Muitas vezes ele fugiu de dentro das instituições. Ninguém consegue segurar Cristiano. Conheci a Wal (Ferrão, presidenta do Portal Kids) quando gravei a novela Prova de Amor, do Tiago Santiago. Foi a produção da Rede Record que me apresentou a Wal, dizendo que ela podia me ajudar. Os técnicos do projeto Mães do Brasil vieram diversas vezes em minha casa, conversaram com meus vizinhos, pesquisaram nas instituições que cuidaram do caso de meu filho. Cristiano não demorou a ser localizado. Ele disse que tinha o sonho de fazer balé. Wal arrumou um curso para ele. Cristiano ficou feliz da vida, mas no dia da primeira aula, fugiu”, conta Maria, sem entender.
Antes de ganhar a assistência do projeto Mães do Brasil, que tem o apoio do Criança Esperança, Cristiano sofreu um surto psicótico e foi atendido por uma psiquiatra da Colônia Juliano Moreira, em Jacarepaguá, que levantou a possibilidade do menino sofrer de Transtorno Bipolar de Humor, novo nome da antiga Psicose Maníaco-Depressiva (perturbação afetiva que alterna estados depressivos com estados maníacos). Porém, até agora, a mãe não consegue encaminhar o menino para uma análise mais detalhada de seu problema no setor público. Em sua última ida ao Hospital Municipal Infantil Menino Jesus, em Vila Isabel, zona norte do Rio, o clínico geral que o atendeu também suspeitou que Cristiano sofre de um problema renal e de sopro no coração. “Mas não consigo levar o tratamento adiante porque o Cristiano sempre foge”, lamenta Maria.
De acordo com a assistente social do projeto Mães do Brasil, Maria Julia Rodrigues, que cuida do caso de Cristiano desde agosto de 2006, o fundamental é obter uma autorização oficial para que o caso do menino seja acompanhado detalhadamente. “Já apelamos para todo tipo de instância. Agora, iremos ao Fórum de Madureira pedir audiência com a promotoria. Vamos requisitar ao Juiz que nos dê um documento autorizando que alguma entidade especializada se responsabilize pelo caso de Cristiano, que precisa ser acompanhado de perto. Nossa maior dificuldade não é localiza-lo e sim, conseguir esse atendimento quando conseguimos resgata-lo das ruas. Além da burocracia, enfrentamos o despreparo das instituições para lidar com o problema dele”, lamenta.
Maria do Socorro nasceu no Maranhão e teve Cristiano no Rio de Janeiro. O pai dele abandonou Socorro e o filho quando este ainda não tinha completado um ano de vida. Além dela, que é diabética e hipertensa, o menino não tem mais ninguém para cuidar dele. Disposta a dar uma vida digna ao filho, Socorro conseguiu com a ajuda do dinheiro da faxina, comprar um barraco para eles e todo o extra que sobra é gasto em comida, roupas e brinquedos para Cristiano, que está longe da escola desde que iniciou suas fugas.
Segundo a psicóloga das Mães do Brasil, Valéria Magalhães, o caso de Cristiano é raro. “Ele não foge de casa porque é maltratado. Realizamos um profundo estudo através de diversas visitas domiciliares e entrevistas com o menino. Podemos atestar que a mãe dá afeto e assistência material ao filho, apesar de suas precárias possibilidades. Seu caso precisa ser estudado a fundo por um especialista antes que, durante essas fugas, Cristiano acabe se envolvendo na marginalidade ou se tornando vítima dela. O caso dele nos comove profundamente. Sabemos que a recuperação é possível desde que receba o tratamento adequado. Mas estamos numa luta contra o tempo”, preocupa-se Valéria.
Boa parte do que Maria do Socorro ganha no trabalho também é gasto a procura do filho. Em Madureira, onde ele costuma ir depois de fugir de casa, a vendedora de uma barraca de flores na rua já tem até o número do celular da maranhense. “Quando ela me liga dizendo que o Cristiano está lá, seja a quer horas for, largo tudo, pego uma condução e vou resgatá-lo. Já o encontrei até em Copacabana”, revela.
No momento, Cristiano está desaparecido. No carnaval, depois de comemorar a data com a mãe pelas ruas do bairro onde moram, fugiu novamente de casa na quarta-feira de cinzas. “Ele fugiu nas vésperas de seu aniversário de 11 anos. O presente que comprei para ele está intocado. Chorei muito neste dia. Eu preciso de ajuda para salvar meu filho. Meu maior medo é encontrá-lo morto na rua e sair para buscar apenas o seu corpo”, finaliza.
Por Luciana Tecidio
luciana.tecidio@portalkids.org.br
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